APRESENTAÇÃO
Registrar em um livro o mergulho solitário nas
reminiscências, na memória do que se viveu ou até mesmo o que não foi
vivenciado, mas que de alguma forma marcou o imaginário, é como emergir desse
mergulho e trazer à tona, aos olhos do leitor, a possibilidade de que ele mergulhe
em sua própria história, seja pela semelhança, ou até mesmo pela diferença –
contudo, jamais sem que o leitor fique indiferente ao convite à reflexão. Ao
ler o livro Dedos de Prosa, seja na sequência de conto a conto, ou folheando um
ou outro aleatoriamente, confirma-se tal intento.
Dedos de prosa é uma coletânea de contos, ambientados no
estado natal do autor, Pernambuco, em cuja edição o autor utiliza também o
espaço, com ilustrações em fotografias e desenhos, tornando as histórias mais
verossímeis e cumprindo também o papel de homenagear pessoas que lhe são caras,
além de outras pessoas, cenas e lugares, que o remetem às lembranças, ou que
foram o norte de suas inspirações. São histórias
completas e fechadas e em cada uma delas há uma nova ação, caracterizadas pela
concisão e precisão, além de uma densidade poética sem extremos, nada é tão
pesado, nem tão leve, mas que causam no leitor, efeitos de inquietação,
excitação e emoção. O autor alterna histórias da infância, da juventude e as da
vida adulta, quebrando o ritmo de continuidade, de sequência cronológica,
conferindo-lhes a característica de atemporalidade. Da mesma forma, ele funde
situações reais às outras ficcionais, aludindo aos fatos ou criando cenas,
cenários e personagens que se encaixam perfeitamente neste jogo lúdico de dar
vida à sua história.
Carlos Lopes narra com muita naturalidade em alguns textos
que remontam à infância, tais como (Inha, um doce de papagaio; Pedrinha; A Roda
e o chão) - entre outros, a simplicidade de uma criança, a ingenuidade das
brincadeiras, a curiosidade, a criatividade diante dos poucos recursos das
épocas específicas e o apego aos animais. Em alguns textos aparecem referências
já na idade adulta como repercussões das lembranças e aprendizados da infância.
Outros se referem às passagens da juventude, às travessuras, o princípio da
independência, os sonhos, os arroubos de paixão, sempre permeados de reflexões
de cunho psicológico (reações do homem diante da paixão, do prazer das
descobertas), ou ainda naqueles textos que já na idade adulta, o autor propõe
reflexões filosóficas de cunho moral e social, sobre a miséria humana (A moça
do jornal) e sobre comportamento do homem diante de suas mazelas na vida.
Outro aspecto marcante do autor é a forma como ele se
relaciona afetivamente com seus animais de estimação e como ele lhes dá um
espaço de protagonistas (Otávio, Tutinha e os outros) de suas próprias
histórias, dando-lhes voz própria, como se fossem eles próprios a narrá-las,
com surpreendente realismo. Em outros momentos a afetividade torna-se novamente
o ponto alto da narrativa, quando rende homenagens aos amigos, quando refere ao
pai ou à mãe com admiração e respeito e às muitas lembranças que são motes da
maioria de seus textos. Carlos Lopes desta forma empresta aos seus textos, a
sua percepção sensível e simples sobre a nobreza dos sentimentos e enlaça o
leitor pela simplicidade da emoção.
A linguagem, os costumes da cultura regional são colocados
de forma clara e agradável, o que deixa o leitor à vontade e que permite a ele
penetrar nos ambientes, nas cenas como se elas lhe fossem familiares. Há que se
destacar igualmente, a importância da contribuição do autor para a valorização
e preservação da cultura local. Trata-se, portanto, de uma obra admirável.
Tenho imenso orgulho em apresentar essa, que é a segunda
obra do autor e amigo Carlos Lopes e a quem agradeço pela generosidade e confiança.
Celêdian Assis de Sousa
Belo Horizonte - MG